Dom Helder Câmara
“Partir é, antes e tudo, sair de si. Romper a crosta de egoísmo que tende a aprisionar-nos no próprio eu. Partir é não rodar, permanentemente, em torno de si, numa atitude de quem, na prática, se constitui centro do Mundo e da vida. Partir é não rodar apenas em volta dos problemas das instituições a que pertence. Por mais importantes que elas sejam, maior é a humanidade a quem nos cabe servir. Partir, mais do que devorar estradas, cruzar mares ou atingir velocidades supersônicas, é abrir-se aos outros, descobri-los, ir-lhes ao encontro. Abrir-se às idéias, inclusive contrárias às próprias, demonstra fôlego de bom caminheiro. Feliz de quem entende e vive este pensamento: ”Se discordas de mim, tu me enriqueces”. Ter ao próprio lado quem só sabe dizer amém, quem concorda sempre, de antemão e incondicionalmente, não é ter um companheiro, mas sim uma sombra de si mesmo. Desde que a discordância não seja sistemática e proposital, que seja fruto de visão diferente, a partir de ângulos novos, importa de fato em enriquecimento. É possível caminhar sozinho. Mas, o bom viajante sabe que a grande caminhada é a vida e esta supõe companheiros. Companheiro, etimologicamente, é quem come o mesmo pão. O bom caminheiro preocupa-se com os companheiros desencorajados, sem ânimo, sem esperança… Advinha o instante em que se acham a um palmo do desespero. Apanha-os onde se encontram. Deixa que desabafem e, com inteligência, com habilidade, sobretudo, com amor, leva-os a recobrar o ânimo e voltar a ter gosto na caminhada. Marchar por marchar não é ainda verdadeiramente caminhar. Para as minorias Abraâmicas, partir, caminhar significa mover-se e ajudar muitos outros a moverem-se no sentido de tudo fazer por um mundo mais justo e mais humano.” |
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